Na Região Sul, as capitais do Paraná, Curitiba, e do Rio Grande do Sul, Porto Contente, terão segundo vez nas eleições municipais para definir quem será o prefeito nos próximos quatro anos. Nas duas cidades, os negros vivem em média dez anos a menos do que os brancos. Em ambas as capitais, a diferença salarial entre homens e mulheres passa de 20%.
Esses são alguns dos temas avaliados pelo Instituto Cidades Sustentáveis (ICS) no levantamento Grandes Desafios das Capitais Brasileiras, que reúne dados e indicadores com foco nas eleições municipais de 2024.
Em Curitiba, a idade média ao morrer para brancos e amarelos é de 71,5 anos. Para pretos, pardos e indígenas, a idade cai para 61,8 anos, ou seja, 9,7 anos de diferença. Já na capital gaúcha, as idades são 73,8 anos (brancos e amarelos) e 64,3 anos (pretos, pardos e indígenas) – diferença de 9,5 anos. Os dados são do Sistema de Informação de Mortalidade do Ministério da Saúde, com referência em 2022.
“É uma diferença bastante elevada para estar dentro de uma mesma cidade, logo isso mostra que temos uma vulnerabilidade acentuada da população negra e que isso é uma questão que merece um olhar de programas, políticas públicas e investimentos em relação a esse tema na cidade”, explica o coordenador-geral do Instituto Cidades Sustentáveis, Jorge Abrahão.
Segundo ele, os governos não têm tido sensibilidade em relação ao tema. “Esse item integra muitos outros. A baixa idade média ao morrer reúne uma questão de homicídios maiores, mortalidade infantil maior, habitação precária, as questões de ensino e saúde. Portanto, isso denota uma infraestrutura mais precária para a população negra.”
Diferenças salariais
Outro ponto crítico nas duas capitais indigitado pelo estudo do Instituto Cidades Sustentáveis é a diferença entre os rendimentos de homens e mulheres, levando em conta dados da Pesquisa Vernáculo por Exemplar de Domicílios Contínua (Pnad Contínua), divulgada pelo Instituto Brasílico de Geografia e Estatística (IBGE). Em Curitiba, as mulheres recebem em média 27,28% a menos do que os homens e, em Porto Contente, a diferença é de 23,73%.
“Isso denota uma estruturação do machismo nessas cidades e que precisa de alguma maneira ser enfrentada”, diz Abrahão.
Segundo o coordenador do ICS, apesar de não ter a atribuição de interferir na política salarial das empresas, o poder público pode fazer campanhas para diminuir essas desigualdades. “Ele tem o poder, dentro do seu escopo, de trabalhar campanhas e prosseguir em um processo em que ele estimule essa redução de valores, valorizando essa aproximação e a redução dessa desigualdade entre o salário de homens e mulheres”, diz.
Instrução
Na ensino, Porto Contente apresenta o segundo valor mais inferior do Índice de Desenvolvimento da Instrução Básica (Ideb) na rede municipal nos anos iniciais do ensino fundamental. Com nota 4,7 em uma graduação de 0 a 10, nos anos iniciais do ensino fundamental, a cidade só fica detrás da capital do Rio Grande do Setentrião, Natal (4,5). No outro extremo, Curitiba está em quarto lugar entre as capitais, com nota de 6,3.
“A gente consegue perceber aí um descaso com a qualidade da ensino. Uma vez que é que é uma uma cidade rica uma vez que Porto Contente, com com uma boa base de infraestrutura em relação a outras cidades, tem um nível de ensino que é um dos piores do país?”, questiona Abrahão.
O Ideb é o principal instrumento de monitoramento da qualidade da ensino básica do país. Ao reunir dados sobre o índice de aprovação e de desempenho dos estudantes em língua portuguesa e matemática, o indicador averigua desempenho e indicadores de fluxo e trajetória escolar.
Gestão de Riscos
Em maio deste ano, Porto Contente enfrentou uma das maiores enchentes de sua história, afetando mais de 157 milénio pessoas e deixando mais de milénio desabrigados. Segundo a professora Silvana Krause, do Programa de Pós-Graduação de Ciência Política da Universidade Federalista do Rio Grande do Sul (UFRGS), a tragédia ocorrida na cidade, com suas causas e consequências, está sendo o principal tema de debate na eleição da capital gaúcha.
“A questão da tragédia de maio centralizou todo o debate dos candidatos. A expectativa era de que o candidato a prefeito que está concorrendo à reeleição fosse o mais prejudicado diante da tragédia, e não é o que está aparecendo nas pesquisas de intenção de voto”, diz a professora.
Em um ranking elaborado pelo Instituto Cidades Sustentáveis, que mede as estratégias de gestão de riscos das 26 capitais, Porto Contente aparece em 22º lugar. Segundo o levantamento, a capital gaúcha tem verificadas 44% das 25 estratégias contra enchentes, inundações e deslizamentos de encostas. O repto para a gestão que assumirá a prefeitura de 2025 a 2028 é chegar a 81% das estratégias cumpridas. Para 2030, a meta é chegar a 100%.
Entre as estratégias avaliadas estão a elaboração de leis que contemplem a prevenção de enchentes ou inundações graduais, enxurradas ou inundações bruscas; legislação sobre o uso e ocupação do solo e mecanismos de controle e fiscalização para evitar ocupação em áreas suscetíveis aos desastres; além de projecto de contingência.
Jorge Abrahão alerta que, apesar de a questão do clima ser um tema global, as cidades devem se preparar para as consequências das mudanças climáticas. “A consequência das enchentes não está nas mãos de um governo municipal resolver, mas o que está nas mãos de um governo municipal resolver é a redução de riscos em relação a isso e os processos de adaptação que a gente pode ter, de mitigação dessas questões. E esse índice mostrou que Porto Contente não estava preparada mesmo.”
Segurança e transporte
Em Curitiba, outra questão em debate nas eleições municipais é a segurança pública, principalmente na região mediano da cidade. “Estamos com um problema grave no núcleo de Curitiba, de segurança e de saúde pública, com muitos usuários e muito tráfico de drogas. E é preciso que o prefeito tome uma atitude quanto a isso na região mediano da cidade, que está bastante grave”, avalia o professor de ciência política da Universidade Federalista do Paraná (UFPR) Bruno Bolognesi.
Segundo estudo do ICS, Curitiba tem índice de homicídio juvenil masculino de 9,68 a cada 100 milénio habitantes no caso de brancos e amarelos e de 8,84 para pretos, pardos e indígenas.
O transporte público da capital paranaense, que já foi referência de qualidade para todo o país, também tem sido questionado na eleição municipal deste ano. “Curitiba já foi referência no Brasil em transporte público e hoje perdeu um pouco desse embalo, ficou um pouco estagnada no que foi feito nos anos 1990. Portanto faz 30 anos que não tem uma inovação”, diz Bolognesi.
Em Porto Contente, o debate sobre o transporte público envolve os impactos da desestatização da companhia de ônibus Carris, realizada no ano pretérito. “Isso atinge principalmente as regiões mais periféricas, os setores que mais necessitam”, diz a professora Silvana Krause.
Disputa
Os candidatos Eduardo Pimentel (PSD) e Cristina Graeml (PMB) disputarão o segundo turno das eleições para a prefeitura de Curitiba no próximo dia 27 de outubro. No primeiro vez, Pimentel, que é o atual vice-prefeito, teve 313.347 votos, o que corresponde a 33,51% dos votos válidos. Cristina Graeml ficou com 291.523 votos, totalizando 31,17%.
Em Porto Contente, o segundo turno será disputado pelo atual prefeito, Sebastião Melo (MDB), que conquistou 345.420 votos (49,72%) no primeiro vez, e Maria do Rosário (PT), com a preferência de 182.553 eleitores (26,28%).