De um mirone no sobranceiro do Morro do Adeus, no Multíplice do Teutónico, é provável ter uma visão quase que completa do conjunto de comunidades que fica na zona setentrião do Rio de Janeiro. É justamente essa visão para as favelas que o Favelas 20 (F20) quer que permeie as discussões e ações do G20, o grupo das principais economias do mundo, incluindo a União Europeia e a União Africana.
O F20 aproveitou o Dia Vernáculo da Favela, nesta segunda-feira (4), para entregar a representantes do G20 – leste ano sob presidência brasileira – um documento com uma lista de ações prioritárias para combater questões porquê desigualdade e melhorar a qualidade de vida dos moradores de comunidades. Uma das propostas é a geração de um fundo para financiar o desenvolvimento das favelas.
“Nós não estamos cá exclusivamente para ser ouvido. Queremos participar da construção”, disse durante a cerimônia Rene Silva, fundador da Voz das Comunidades, organização não governamental (ONG) nascida no Multíplice do Teutónico que se destacou com ações de jornalismo comunitário.
“A favela faz segmento da solução, a favela tem a solução”, diz. “Quando a gente vai elencar todos os temas que são debatidos dentro do G20 pelas lideranças mundiais, todos os temas passam pela nossa vida, pelo nosso cotidiano das pessoas que moram cá dentro das favelas”, completa.
Um dos fundadores do F20, Erley Papa enfatiza a participação e integração de moradores de favelas no processo de elaboração das propostas.
“Sempre quando propomos ações, eventos e outras propostas, elas acontecem dentro da favela, porque, de roupa, é daqui que tem que transpor as recomendações”, disse Erley Papa à Sucursal Brasil.
O F20 é uma iniciativa conduzida pela Voz das Comunidades, em pronunciação com outras organizações, dentro e fora do Brasil. Desde maio deste ano, foi realizada uma série de encontros para debater e sugerir propostas. É a primeira vez que as discussões no contexto do G20 contam com voz ativa de representantes de comunidades.
Apontando que tapume de 20% da população brasileira mora em favelas e periferias, Rene Silva criticou a falta de atenção e representatividade política que as comunidades têm. “Nosso espaço dentro desse sítio de poder é muito pequeno”, lamentou.
Segundo ele, os moradores não participam da construção de políticas públicas. Ele deu porquê exemplo a instalação de um teleférico no Multíplice do Teutónico, em 2011.
“Nunca nos foi perguntado se, no Multíplice do Teutónico, os moradores preferiam um entrada ao teleférico, que está parado desde 2016, logo depois da Olimpíada, ou se a gente preferiria um entrada maior ao saneamento essencial, à chuva potável, mais espaços culturais, entrada à tecnologia”, elencou.
“A favela pode e deve contribuir com essa transformação. A gente tem um papel fundamental, importantíssimo, quando a gente fala sobre porquê erigir essa solução. Por isso esse documento, o surgimento do F20”, apontou Rene Silva.
Moradores
As queixas registradas no documento, chamado formalmente Communiqué, fazem segmento da vida de Francisco Santiago Rebento. Há tapume de 65 anos no Morro do Adeus, ele se intitula porquê um dos habitantes que moram há mais tempo no conjunto de favelas.
“Tinha um teleférico aí, mas acabou. Acho que nem volta mais. Estou velho para subir esse morro todinho”, queixou-se.
Outra moradora, Sônia da Silva Ferreira, há 40 anos na comunidade, reforça a reclamação. “Teleférico faz muita falta para a gente. Eu quero que esse evento ajude a melhorar”, espera ela que chegou a trabalhar na obra de construção do meio de transporte e precisa subir a pé ou remunerar motoboys para chegar ao sobranceiro do morro.
A Sucursal Brasil procurou a Secretaria Estadual de Infraestrutura e Obras Públicas. A pasta informou que as obras de recuperação do teleférico estão em curso, com mais de 80% dos serviços de reforma das seis estações concluídos.
A secretaria informou ainda que realiza as contratações da compra e instalação dos cabos eletromecânicos, que dão sustentação às gôndolas, além dos equipamentos porquê escadas rolantes.
“A secretaria trabalha para entregar todo o sistema completamente renovado à população, visando facilitar o deslocamento quotidiano dos moradores e a reativação de importantes serviços nas estações”, completa a nota.
Porquê ainda há licitação sendo realizada, a pasta não pôde informar um prazo definido para a entrega do meio de transporte.
Communiqué
Além de ser entregue a autoridades – a término de que chegue aos líderes que participarão da reunião de cúpula do G20, nos dias 18 e 19 de novembro – o Communiqué pode ser acessado pela sociedade neste endereço.
A publicação tem seis grupos de policy briefs, ou seja, conjuntos de recomendações, nas áreas de combate às desigualdades, pobreza, rafa e promoção da saúde mental; combate à crise climática e promoção da transição energética justa; entrada à chuva potável, saneamento essencial e higiene pessoal; combate a risco de desastres naturais; transformação, inclusão do dedo e cultural; e finanças sustentáveis.
Cofundador do F20 e um dos organizadores do documento, Erley Papa destaca entre as propostas um fundo para financiar o desenvolvimento das favelas.
“O ponto médio é que se crie um fundo voltado para as favelas e periferias, porque só assim nós conseguimos asseverar entrada à chuva e saneamento, que se tenha moradias mais resilientes frente às mudanças climáticas, direitos para empreendedores locais, para mulheres, jovens, população LGBTQIA+, comunidades indígenas e várias outras comunidades”, frisou.
Erley Papa destacou ainda que o F20 se pautou por discussões locais e soluções globais. “O que acontece, muitas vezes, nas comunidades onde você mora acaba sendo um revérbero que acontece também em outras comunidades. Portanto é uma forma de a gente conseguir também compartilhar conhecimento, compartilhar a solução”, explicou.
Entre os problemas comuns em favelas ao volta do mundo, Erley citou a falta de entrada ao saneamento essencial e chuva potável. No mundo, tapume de 1 bilhão de pessoas moram em favelas, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU).
Morando há tapume de 20 anos em comunidades, a cantora indígena Kaê Guajajara destacou a presença de representantes indígenas entre os habitantes de favelas e periferias.
“Desde 1500, os povos indígenas foram sendo colocados em várias situações, inclusive a resistência e sobrevivência na cidade, na favela, justamente por a gente não ter condições de permanecer se mantendo na pista”, relatou, usando a gíria “pista”, referente a quem não mora em comunidade.
“Eu conheço vários indígenas favelados, mas a gente ainda não está ocupando [politicamente] esse lugar, para que a gente consiga mais políticas públicas dentro desses espaços”, afirmou.
Autoridades
Na presidência brasileira do G20, a interlocução com movimentos sociais é coordenada pela Secretaria-Universal da Presidência da República (SGPR), do ministro Márcio Macêdo. Ele participaria da cerimônia de recebimento do Communiqué, mas não pôde comparecer, por ter sido chamado para uma reunião de última hora com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O secretário pátrio de Juventude, Ronald Sorriso, vinculado à SGPR, representou o ministro Macêdo e recebeu em mãos o documento do F20. O secretário destacou que o G20 Social, que propõe a pronunciação direta com a sociedade social organizada, é uma inovação da presidência brasileira no G20, com reuniões de 14 a 16 de novembro.
“Todo esse rio que foi sendo formado ao longo dos meses de debate vai desaguar no mar de grandes ideias de grandes proposições”, disse.
O secretário acrescentou que o governo está comprometido a manter diálogo com movimentos sociais em seguida o G20, para que propostas das comunidades possam virar verdade.
“A gente acredita que vai ter um caldo muito grande de proposições a serem aproveitadas pelo governo federalista. Mas o mais importante também é fazer com que isso seja aproveitado pelos outros países e que tenha perenidade na presidência da África do Sul, que já é um pacto que está sendo tecido por nós”, disse Sorriso, lembrando que o país africano será o presidente rotatório do G20 em 2025.
Outro representante do governo a receber a epístola de propostas do F20 foi o subsecretário de Finanças Internacionais e Cooperação Econômica do Ministério da Herdade, Antonio Freitas.
Ele destacou que uma das propostas prioritárias do Brasil no G20, a taxação de super-ricos, pode ser um dos meio de alavancar o desenvolvimento das favelas.
“Não é exclusivamente uma questão de transferência orçamentária, é uma questão política. O sistema está funcionando de uma maneira que uma parcela muito minoritária da população mundial está acumulando recursos de maneira absolutamente desproporcional, sem contribuir para o bem-estar coletivo”, afirmou.
Segundo o subsecretário do Ministério da Herdade, o Brasil foi bem-sucedido ao levar a propostas para outros países. No entanto, ele admitiu que o progresso não é simples. “O projecto internacional é um projecto muito difícil, as coisas demoram para se materializar, mas o passo inicial foi oferecido”, afirmou.
G20
O G20 é formado por 19 países: África do Sul, Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, China, Coreia do Sul, Estados Unidos, França, Índia, Indonésia, Itália, Japão, México, Reino Uno, Rússia e Turquia, e duas alianças regionais: a União Africana e a União Europeia.
Os integrantes do grupo representam tapume de 85% da economia mundial, mais de 75% do transacção global e tapume de dois terços da população do planeta.
Dia Vernáculo da Favela
O Dia Nacional da Favela é lembrando em 4 de novembro, em referência à primeira vez que o termo foi utilizado em um documento solene, em 1900. Foi um patrão de polícia que usou o termo para se referir ao conjunto de habitações precárias que formavam uma comunidade do Morro da Providência, região médio do Rio de Janeiro.