A licença da gestão dos cemitérios municipais à iniciativa privada, repassada às administradoras em março do ano pretérito, elevou os preços dos enterros e cremações na cidade de São Paulo. Levantamento do Sindicato dos Servidores Municipais de São Paulo (Sindsep) mostrou que os valores de pacotes para realização do funeral mais que triplicaram em cemitérios da cidade em seguida a licença.
Quatro empresas assumiram a gestão do serviço funerário na capital paulista. Ao todo, são 22 cemitérios públicos e um crematório. Os contratos preveem que as concessionárias são responsáveis pela operação dos serviços, gestão, manutenção, exploração, revitalização e expansão das unidades. A vigência do contrato de licença é de 25 anos.
“A principal questão é o valor do serviço que aumentou muito. Essa é a principal denúncia que existe, os preços são exorbitantes. E é facilmente comprovado pela tábua que eles próprios [empresas] divulgam”, disse o secretário de assuntos jurídicos do Sindsep, João Batista Gomes. Ele avalia que a subida nos preços está diretamente ligada à licença das unidades. O levantamento contempla as duas empresas que disponibilizam os valores no site, cujas concessões abrangem 11 cemitérios.
Ele relatou que a privatização prejudicou também o encaminhamento de denúncias, já que todos os servidores municipais foram deslocados e substituídos por funcionários das empresas. “Esses trabalhadores até tem sindicato, mas é muito frágil a relação [de trabalho] deles. Logo o pessoal tem susto de denunciar”, disse Gomes.
O vereador Hélio Rodrigues afirma que, desde o início da licença, recebeu inúmeras denúncias sobre os cemitérios e as cobranças indevidas realizadas pelas concessionárias. Ele reiterou a relação entre a privatização e o encarecimento do serviço. “Sem incerteza, esses reajustes são consequência da licença. Também existem muitos relatos de cobranças de valores diferentes do que consta nas tabelas oficiais e falta de transparência em relação aos valores praticados”, relatou.
“Também tivemos muitas denúncias dos trabalhadores, uma vez que é o caso dos jardineiros e empreiteiros autônomos que prestam serviços nos cemitérios e estão regulamentados por uma portaria do município, mas sofrem assédio frequente das concessionárias que dificultam seu aproximação aos locais, abordagem a famílias e a realização de seus trabalhos. Nosso procuração conseguiu a renovação da autorização de trabalho até dezembro de 2024”, acrescentou.
Os encaminhamentos do parlamentar incluem ofício para a Secretaria Vernáculo dos Direitos do Consumidor noticiando a cobrança indevida de diversos serviços, uma vez que a tanatopraxia (um tipo de limpeza do corpo) em duplicidade, e representações ao Tribunal de Contas do Município (TCM) sobre auditoria nos cemitérios.
O TCM reconheceu a falta de informações divulgadas pelas empresas acerca da gratuidade e dos preços dos funerais aos munícipes. O tribunal reconheceu também o descumprimento de uma informação visível e de fácil aproximação aos munícipes informando que não são obrigados a contratar o serviço de jardinagem e manutenção dos jazigos diretamente com a concessionária, e que eles têm a livre escolha de contratação de profissionais autônomos.
Até janeiro deste ano, as concessionárias atuaram com seguimento do Serviço Funerário do Município de São Paulo, uma vez que segmento da tempo de implementação. A Sucursal Reguladora de Serviços Públicos do Município de São Paulo (SP Regula) é responsável pela fiscalização e gestão contratual das concessões.
Prefeitura
A prefeitura de São Paulo informou, em nota, que a qualidade dos serviços e o cumprimento de todas as cláusulas contratuais da licença são monitoradas periodicamente pela SP Regula. “É fundamental que os munícipes formalizem as reclamações ou sugestões por meio da Ouvidoria Universal do Município, do site da SP Regula ou pelos canais de atendimento SP156. Todos os casos são rigorosamente apurados”, diz a nota.
“O funeral social (pacote mais barato comercializado hoje) custa R$ 566,04, ou seja, 25% mais barato do que o pacote ‘Jasmim’, que era o mais barato antes da licença (R$ 754,73). Os demais pacotes mantiveram os preços de 2019, com exclusivamente a correção prevista no primeiro ano de contrato”, acrescentou a prefeitura.
A nota diz ainda que “desde o início da licença, houve avanços na qualidade dos serviços, com a implementação de padrões mínimos para urnas funerárias e cinerárias, definição do tempo de velório e monitoramento do corpo”.
Celso Vitor Souza, de 61 anos, disse que a concessionária do cemitério Vila Novidade Cachoeirinha não presta informações que esclareçam sobre as antigas concessões de uso de sepultura, feitas antes da licença dos cemitérios à iniciativa privada. Nascente é o caso de sua família, que está sendo cobrada em R$ 20 milénio para renovação da licença de uso. No sítio, foram enterrados os pais e irmão de Celso.
“Em julho deste ano, a família foi realizar a exumação [do meu irmão] e foram impedidos. Os agentes funerários alegaram que a licença venceu e era necessário o pagamento de R$ 20 milénio. Procurei a Defensoria Pública, que exigiu as informações por escrito. Só portanto foi permitida a exumação. No entanto, até o momento continuo sem saber quais são os meus direitos com relação ao túmulo da família”, relatou Celso.