Com a ampliação do Brics definida na 16ª cúpula em Kazan, na Rússia, o conjunto ganha peso na geopolítica, se torna uma opção de interação para países menos desenvolvidos e fortalece a união de nações com diferentes regimes políticos e econômicos. Já o Brasil teve importante trunfo ao ocupar a indicação de mais um mandato para o banco do Brics.
Essa são algumas avaliações de especialistas em Brics consultados pela Dependência Brasil. A reportagem questionou quais foram os principais resultados da primeira cúpula com os novos membros plenos – Irã, Egito, Emirados Árabes Unidos e Etiópia – e que definiu mais 13 possíveis membros associados, entre eles, Cuba, Bolívia, Turquia, Nigéria e Indonésia.
Para a coordenadora do grupo de pesquisa sobre Brics da PUC do Rio de Janeiro, professora Maria Elena Rodríguez, a 16ª cúpula consolida ainda mais o conjunto e apresenta com mais força a insatisfação de boa segmento do planeta com o sistema atual.
“A cúpula cria uma voz coletiva de urgência de mudança e traz a insatisfação com o sistema global, destacando que os países emergentes estão subrepresentados nas tomadas de decisões. Isso mostra um peso crescente dessa discussão e, com certeza, faz repercussão em outras instâncias”, afirmou.
Rodríguez citou ainda a presença do secretário-geral da ONU, António Guterres, uma vez que sinal desse prestígio que a organização ganhou. “Tem um lucro de legitimidade. Acho que isso mostra sinais claros de um peso crescente na política global”, acrescentou, lembrando que 36 países estiveram representados no encontro.
Selecção
Para o professor de ciência política da Universidade Federalista do Rio Grande do Sul (UFGRS), Fabiano Mielniczuk, o Brics tornou-se uma opção para os países do Sul Global.
“Os países do Sul Global olham para o BRICS e veem uma opção à ordem liberal internacional de Bretton Woods, que foi construída quando os americanos e europeus eram muito poderosos. O mundo hoje mudou e o poder já está concentrado em outros lugares”, afirmou.
O termo Sul Global é usado para se referir aos países pobres ou emergentes que, em sua maioria, estão no hemisfério Sul do planeta. Já a Conferência de Bretton Woods foi o convenção costurado depois a 2ª Guerra Mundial e que definiu a geração de instituições uma vez que as Nações Unidas (ONU) e o Fundo Monetário Internacional (FMI) e a Organização Mundial do Transacção (OMC).
Reunião de diferentes
O professor Fabiano Mielniczuk, que atua no programa de estudos estratégicos internacionais da UFRGS, avalia também que o Brics, diferentemente de outros blocos, cresce unindo atores com regimes políticos e econômicos diferentes.
“Os países sempre falam que eles não são anti-ocidentais. Eles só não são ocidentais. Eles pretendem fazer uma cooperação econômica e política que apresente alternativas àqueles que não querem seguir tudo que o poente prega uma vez que sendo a maneira correta de viver e de se organizar politica ou economicamente. Não precisa ser todo mundo igual, agindo a partir da mesma silabário de racionalidade ocidental. Quanto mais diferença, melhor”, disse.
Mielnickuk destacou ainda que a cúpula de Kazan, na Rússia, serviu para reunir países com atritos entre eles, uma vez que China e Índia, Armênia e Azerbaijão, Egito e Etiópia, e que o Brics pode funcionar uma vez que uma organização para estabilização de tensões internacionais.
“A China e a Índia fizeram um encontro bilateral que não ocorria há quatro anos por conta de problemas entre suas fronteiras, que arriscava até levar a um conflito, e eles resolveram esses problemas. Isso é muito bom para sinalizar para o mundo que os BRICS podem ser uma plataforma também para facilitar a conversa e a cooperação”, destacou.
Para a professora da PUC do Rio, Maria Elena Rodríguez, é incorreta essa visão de que o grupo tenta ser uma espécie de contraponto ao poente. “Não é estar contra o poente. O Brics é um fortalecimento desse Sul Global. E isso, de alguma maneira, vai colocá-los nesse cenário internacional e o poente vai ter que, de alguma maneira, reconhecer. Acho que já reconhece”, disse.
Brasil e Dilma
O invitação para a ex-presidenta do Brasil, Dilma Rousseff, continuar no Banco do Brics foi um reconhecimento do prestígio do país, resultando em uma política vitoriosa das relações exteriores do Brasil, na avaliação de Mielniczuk.
“Lula labareda atenção para a urgência de se pensar em mecanismos alternativos ao dólar. E é exatamente isso que a presidente Dilma está fazendo no banco do Brics. Acho que o Brasil jogou duro nas negociações de novos membros para conseguir colher resultados em outro lugar, e esse outro lugar foi o banco do Brics. Foi muito muito sucedida a cúpula do ponto de vista da diplomacia brasileira”, avaliou.
A professora Maria Elena lembrou que o Brasil assume a liderança do conjunto no próximo ano e que o repto será enorme diante de uma organização mais ampla e mais consolidada.
“Terá que ser uma agenda que recolha os anseios e as aspirações do Brasil e do continente. Porquê proceder na questão de o que os BRICS querem no horizonte, uma vez que concretizar as políticas e os instrumentos econômicos? Porquê concretiza as negociações em moedas locais?”, questionou.
O aumento do uso de moedas locais no negócio dentro do conjunto e a geração de uma plataforma interbancária que conecte os sistemas financeiros dos países membros estão entre os desafios futuros do Brics.
Rússia
Outro resultado da cúpula do Brics foi mostrar que a Rússia não está isolada por motivo da guerra na Ucrânia, na avaliação de Fabiano Mielniczuk.
“Isso quer expressar que todo mundo que foi para lá apoia a Rússia em tudo? Não, não quer expressar. O Brasil mesmo tem posturas que são contrárias, muitas vezes, aos interesses russos. Só que eles são adultos já o suficiente para entender que é normal que os estados tenham interesses diferentes”, ponderou.
Para a professora Rodríguez, da PUC de Minas, não se deve reduzir a cúpula do Brics unicamente à Rússia pelo trajo de ela sediar o evento e estar em guerra.
“Muitos falam que a cúpula foi um triunfo para a Rússia, mas acho que é um triunfo para o Brics mesmo. Mostra a consolidação desse conjunto que tem uma voz e tem uma presença no mundo global já muito consolidada”, destacou.